CIÊNCIA

Como dois e dois são quatro

Num país que mal sabe fazer contas, o Instituto de Matemática Pura e Aplicada produz mais trabalhos do que universidades americanas e inglesas

ELISA MARTINS

 

Há uma contradição incrível no ensino brasileiro. Uma pesquisa recente do Instituto Paulo Montenegro mostrou que de cada cinco brasileiros com mais de 16 anos apenas um é capaz de resolver um problema matemático com mais de uma operação, como por exemplo 1 + 6 - 5 x 2. São 77% de semi-analfabetos matemáticos, incapazes de fazer contas, interpretar tabelas ou decidir se vale mais a pena comprar uma lata de leite em pó de 400 gramas a R$ 5 ou uma de 150 gramas a R$ 4,20. Ao mesmo tempo, funciona no país um centro de excelência mundial em Matemática, capaz de desenvolver métodos para prever o tempo, maximizar a recuperação de petróleo em reservatórios e elaborar sofisticados projetos de computação gráfica. Criado em março de 1952, o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa) produz mais artigos científicos do que universidades renomadas como Princeton, Northwestern e Imperial College of London. Forma um quinto dos 60 doutores em Matemática no Brasil por ano.

A partir da terça-feira 19, o Impa abrirá uma exposição no Centro Cultural do Banco do Brasil, no Rio de Janeiro. Tentará exorcizar o medo que os alunos sentem da Matemática, usando exemplos banais de sua aplicação no cotidiano. Um dos destaques é o Visorama, um binóculo virtual inventado no Impa que permite enxergar paisagens sob ângulos diferentes, como se a pessoa estivesse dentro delas.

À primeira vista, parece incomum que o Impa, que oferece ensino de pós-graduação, volte suas forças a uma exposição que tem estudantes de 5ª a 8ª séries como público-alvo. Mas foi assim que talentos como o do sergipano Carlos Matheus Santos, de 20 anos, foram descobertos. Na 8ª série, ele estava desiludido com a escola. Sabia toda a matéria de Matemática antes de o professor explicar e não se sentia desafiado. Aos 14, freqüentou um curso de verão no Impa. Virou o mais jovem doutor formado pelo instituto, aos 19 anos. ''Pensei em fazer Direito, mas desde que comecei a estudar Matemática tudo mudou'', conta. Há duas semanas, Matheus embarcou para o pós-doutorado na França.

No mês passado, na Olimpíada Ibero-Americana de Matemática, na Espanha, a equipe brasileira ganhou medalha de ouro - dois dos quatro integrantes são do Impa. ''O desafio me estimula'', conta um dos vencedores, Fábio Moreira, de 17 anos, mestrando em Computação Gráfica. Nessas provas, cada competidor resolve seis questões que vão de probabilidade até lógica. Uma questão considerada ''fácil'' não é resolvida em menos de 30 minutos. ''Se estudar para encarar essas provas é ser maluco, então eu sou maluco'', brinca. Outro vencedor da competição, o doutorando Alex Abreu, de 18 anos, faz coro. ''Resolver problemas é divertido'', diz. ''É como perguntar a uma pessoa por que ela gosta de jogar bola. Não há explicação.'' Em parceria com a Sociedade Brasileira de Matemática e outras entidades, o Impa realiza a Olimpíada Brasileira de Matemática. Participam 4 mil colégios, com 200 mil alunos a partir da 5a série.

''O Impa é um centro de excelência que contribui para construir conhecimento no país'', derrete-se o ministro da Ciência e Tecnologia, Eduardo Campos. O teste de seleção dos alunos é rigoroso. Não há exigência da conclusão do ensino superior para o ingresso na pós-graduação. ''Mas para garantir o alto nível analisamos com rigor currículo, histórico escolar e carta de recomendação'', conta Cesar Camacho, diretor do centro. Ser uma instituição pequena, com apenas 170 alunos no mestrado e no doutorado - 40% deles estrangeiros - e 32 pesquisadores e professores, faz diferença. Dos funcionários, a maior reclamação é o salário. Um jovem doutor, com até três anos de experiência, ganha cerca de R$ 3.600. Para fazer pesquisas de alto nível, é preciso saber lidar muito bem com os números no banco.